Ao senhor do tempo
O tempo é
algo surpreendente. Limitamos ele. Vivemos como se fossemos morrer a qualquer
momento, mas sempre fazendo planos para o futuro. “Vou fazer
algo porque talvez hoje seja meu último dia, porém caso não morra vou investir
em ações.” Dizemos para nós mesmo que a vida é uma só.
Toda vez que penso no tempo. Toda vez que penso nesta única vida,
me pergunto que diferença faz. Afinal, que diferença faz ser uma única vida?
Em uma busca constante de aceitação, de declarações, de amores de
tirar o fôlego, esquecemos do principal sobre o tempo. Ele não volta!
Penso no tempo como um senhor cansado, com seus cabelos brancos e
bengala, o famoso “Senhor do Tempo”. Esse senhor sabe como as coisas já foram,
lembra dos ventos que tocaram a sua face, de cada onda quebrando na praia ele
lembra também. O senhor do tempo, não tem relógio, nem ampulheta. Sua idade
quem sabe? Suas histórias? São muitas, são de todos.
Em toda a sua existência, o senhor do tempo foi acusado diversas
vezes, muitas promessas feitas em seu nome sem ele nem compactuar, expectativas
criadas em torno dele e, toda a responsabilidade que lhe foi atribuída sem lhe
consultar.
Ao senhor do tempo muito lhe
dado, muito foi cobrado, ele já está cansado. Observador de histórias alheias,
nunca viveu a sua própria. Réu, algoz, tudo menos protagonista. Porém damos a
ele nossas vidas.
Quando nascemos, ele está lá esperando, sentado num canto, com seu
suéter bege, calça capri, mocassim marrom, chapéu preto e uma bengala de bambu.
Sentado na ponta da cadeira, apoiado para frente, apenas observa a nova vida
que está iniciando. Um senhor curvado e pequeno, contudo muito forte.
Ah o tempo! Réu e algoz de nós mesmos.
Ao observar o tempo, lembro de tudo que já vivemos. A ele só é
dado o passado, nada sabe sobre o futuro. Vive apenas do que já se passou,
porém apenas na memória, ele não pode voltar atrás. O futuro é outra pessoa,
aluna do tempo, com ele aprende a escrever sua história. O futuro chega sem
bagagem, absorve do tempo suas malas.
O futuro é uma criança indefesa que carrega muitas malas. Sem
saber seu próximo passo, ela simplesmente caminha em direção ao que a bússola
na mala aponta. Incapaz de tomar as próprias decisões, apenas espera que as
bagagens do senhor do tempo lhe ajudem na jornada.
Vitima de nós mesmos. Culpamos o garoto do futuro como
responsáveis pelas nossas falhas. Fazemos planos com ele, quando não atende
nossas expectativas, culpamos o tempo. O garoto do futuro é uma criança jogando
tetris. Sempre tentando encaixar a próxima peça sem ter ciência das outras que
virão. O garoto do futuro está a mercê do tempo.
Por fim, estamos nós. Responsáveis pelo que vivemos. Dando aos
outros a autoria de nossas vidas. Vítimas do tempo e do futuro. Buscamos tanto
que muitas vezes não apreciamos. O tempo que toca nossa face como uma brisa ou
tempestade. O futuro que como a onda sempre quebra sem aviso. Responsáveis por
nós mesmos. Que nos falta admirar as ondas e os ventos. Viver como temos que
viver. Respirar, comer e se alegrar. Amar e sorrir. Brigar e fazer as pazes.
Chorar, porque a vida também nos faz chorar. Encher o peito com tudo que há de
bom. Apreciar a arte, ouvir boa música. E na nossa memória, na nossa memória os
presentes que a vida deu. Afinal de contas, o tempo não volta e o futuro a Deus
pertence.
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